Aos finais de semana sofro uma bipolaridade social - aos sábados eu gosto de ver pessoas, conhecer novas, rever antigas... e aos domingos não quero ver ninguém. Deve ser uma espécie de ressaca, só que de assunto. E era dessa forma que passava o meu domingo, deitada com Boris em minha cama, assistindo filme debaixo da coberta e devorando um imenso e delicioso chocolate.
Eis que alguém bate na porta.
Não esperava nenhuma visita. E costuma-se avisar antes de ir até a casa de alguém. Principalmente aos finais de semana, os quais as pessoas nunca costumam parar em casa. Pelo menos eu, uma vez por mês, estaria desfrutando de um agradável almoço feito pela minha mãe.
Pensei 300 vezes antes de levantar da cama, mas os latidos de Boris já tinha avisado a quem estava de fora da casa que lá dentro havia uma preguiçosa que não gostaria de ser incomodada.
De moletom e meias largas, abri a porta. Quando vi quem era, desejaria realmente não ter largado minha ultra-mega barra de chocolate.
Era ele. Aquele do passado. O defunto. Personagem principal responsável por toda mutação da minha vida.
Nem o porteiro e nem eu ainda tínhamos dado conta que nosso relacionamento realmente tinha acabado. Não que eu ainda sofresse por ele, nem tão pouco o porteiro, mas terminou de uma forma tão rápida e sem explicação que a ausência dele não parecia ainda ter sido uma eternidade.
Ele quem pediu pra entrar.
Como sempre, desde a nossa separação, eu não tinha aberto a minha boca. Não me dava ao direito de questionar, indagar, cobrar nem tão pouco chorar as pitangas por ele - acreditava que cada um tomava as decisões que melhor cabiam a si. Mas, o vendo novamente diante de mim, tentando iniciar uma conversa que ele mesmo não sabia por onde começar, passei a desconfiar que ele não tinha tanta certeza se a decisão que ele tinha tomado era a melhor.
Ele quebrou o silêncio ' Não vim pedir pra voltar, só pra lhe dizer o quanto eu sinto a tua falta...'
Eu só sabia olhar. E não entendo porque eu, tão segura, decidida sobre o que sou e sinto, ficava tão catatônica diante dele. Eu me sentia ridícula, confesso. Mas se fosse pra abrir a boca e falar besteira pra estragar ainda mais as coisas, eu preferia me calar.
Ele tentou novamente: ' Também vim procurar uma resposta com você do porquê que isso me acontece...'
...Silêncio...
Me dei conta que ainda estávamos de pé. E por eu ainda permanecer calada, ele sugeriu ir embora. Eu precisava reagir:
' Talvez eu não tenha todas as respostas que você precisa, apesar de parecer o contrário...'
E foi a primeira vez que abaixei a minha cabeça a ele.
É tão estranho ouvir um relato que eu acreditava ser o que armava o término dos relacionamentos habituais! Talvez seja porque o nosso nunca foi o habitual.
Ele me abraçou tão forte! E é nessas horas que Boris já se tocava que era hora dele se recolher aos seus aposentos caninos. E cada reação nos parecia uma eternidade, pois me lembro ter ficado durante muito tempo com ele ali, abraçada, em pé na minha sala, no silêncio. Ele sabia como me desarmar, me envolvendo a cintura com seus braços, e quando nos demos conta, já estávamos no meu quarto, nos beijando como da primeira vez que saímos - ele com 17, e eu com 22. Naquela época, eu já tinha tido dois relacionamentos sérios, e ele nenhum.
Nosso namoro começou mesmo alguns anos depois que nos conhecemos. Ele tinha namorado outra pessoa, e eu também. Voltamos a sair e eu que o pediu em namoro, dentro do seu carro, na porta da casa da minha mãe.
Deve ter sido por isso que ele foi o único homem por quem sofri. Passei um bom tempo me perguntando onde foi que eu tinha errado quando ele me deixou no momento que eu mais precisei dele. A única explicação que tive foi 'talvez eu não tenha maturidade pra encarar essa com você.'
Depois daquele ato não pensado, imprevisível e totalmente impulsivo de nós dois, ficamos ali olhando um para o outro, deitados de bruços. Eu o sentia desenhando minha tatuagem com os dedos. Sentamos diante um do outro e, abraçados, sentimos nossas peles, passeando com o dedo indicador por nossas costas e braços.
Sem coragem de olhar para ele, com o rosto totalmente molhado de lágrimas, as quais eu forçava em engolir e elas teimavam em cair, falei ao seu ouvido bem baixinho: 'A resposta da sua pergunta, talvez seja porque você não tem a maturidade pra entender o que você sente, e encarar essa comigo...'
Que lindo...
ResponderExcluirum filminho passou aqui! adorei !
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