Sobretudo não saberia o que dizer. Mentiria, dizendo que seus erros não passaram de descuidos, quando na verdade já sabia que uma hora ou outra iria enganá-la. Era certo que, mesmo com tão pouco tempo junto a ela, ele se arrependeria do que fez. Como tantas outras vezes.
Deveria ser só mais um erro. Só mais um arrependimento. Só mais uma sensação qualquer.
Mas tudo isso seria como deveria ser, apenas se ele não estivesse apaixonado por Melissa. Na verdade, apaixonado foi o termo que lhe restou, uma vez que não “só gostava”, nem “só tinha uma atração” e nem outra coisa do tipo. Estava mais do que certo que era amor o que ele sentia.
Raciocinou por um tempo, e concluiu que se sentia culpado por se sentir culpado pelo fato de tê-la traído. Afinal de contas, traiu por quê? Porque motivo ele fez isso? Teria sido as cochas da moça de lábios vermelhos?
Ele não tinha o mínimo controle sobre suas ações, era como se a infidelidade estivesse impregnada no seu DNA. Traiu Melissa apenas pelo hábito de trair. O gosto do beijo da amante ele não lembrava, mas o de Melissa era memorável. O cheiro da amante lhe escapava com facilidade, enquanto o de Melissa ficava marcado em sua pele, e sempre estava vivo.
Deitado em uma cama, num quarto de motel, ele tinha suas partes cobertas apenas por um lençol, em sua mão o celular com a mensagem de sua amada afirmando a descoberta da infidelidade e decretando fim ao relacionamento, ele sempre soubera, não teria futuro algum.
A amante banhava-se.
Ele continuava imóvel na cama, encarando o teto. Lentamente um projeto de lágrima se formava nos olhos do cafajeste que acabava de descobrir o que é o amor. E consequentemente o que é sofrer por ele.
Após aquilo ele teria uma nova vida. Talvez menos confusa, ou menos sofrida. De fato não sentia mais dor nenhuma, mas a confusão ainda ficava na sua mente. Ele não sabia por que o tempo parecia não passar. Era esquisito o que ele sentia. Palavras não descrevem o que passava pela sua cabeça.
Não se lembrava de nada da sua vida. Melhor, quase nada.
Um beijo. Depois daquele beijo sua vida mudou de maneira inexplicável, rapidamente estava envolvido. Essa era a única lembrança que tinha. Não lembrava nem o próprio nome, só aquela boca fria e úmida e aquela mão gelada deslizando por seu corpo. Maldita. Foi tão bom, tão maravilhoso. Ele lembrava e tentava se explicar como poderia ser tão fascinante sentir o gosto doce, ou amargo, de um veneno escorrendo da boca dela. Ele não sabia por que, mas lambia os lábios daquela estranha como se tivesse profunda necessidade.
Devia ter aprendido a não beijar estranhos. É simples como recusar doces de estranhos.
Infelizmente ele nunca pareceu ligar para regras. Tolo. Era mais um idiota imaturo. Se ao menos lembrasse que devia fidelidade a outra garota ele ainda teria todas suas lembranças intactas. Ela já tinha ganhado uns dez desse tipo só nos últimos três dias. Ele deveria se importar, ou melhor, ter se importado com os conselhos alheios. Agora ele não tinha mais nada com o que se preocupar, já tinha feito o que fez. Talvez se ele se cuidasse nada teria acontecido.
Ao beijar aquela mulher ele fez sua escolha. Desavisado, mas fez sua escolha: o inferno dos infiéis. O tempo para ele passaria lentamente pelo resto de sua existência. Sua memória não era mais seu pertence, todas suas lembranças não teriam mais lugar dentro dele, elas seriam jogadas ao vento, ou no fundo de um poço sem fim. Ele não precisaria mais se lembrar de nada, nem do barulho dos pássaros, nem da sensação de calor, nem da leveza do vento e nem das incertezas do amor.
Sua vida mudou depois daquele beijo.
Depois daquele beijo na Morte.
Postar um comentário