As mesas estavam distantes, mas não o bastante pra impedir um olhar.
Eles sempre iam ali. Separados. Ela sempre o admirava, silenciosamente.
O relógio tiquetaqueava incessantemente, seu coração permanecia mudo.
Os cafés estavam esfriando, a concentração que ele tinha em seu livro era, de uma forma estranha, absurdamente irritante. Ela queria metade da atenção que aquelas páginas tinham, só para ela.
O relógio ainda tiquetaqueava, o coração pulsava.
Os olhos castanhos dele acompanhavam as frases de uma ponta a outra das folhas, em movimentos rápidos e precisos. As palavras jogadas ali entravam e arranjavam lugar na mente dele, tornando-se algo que permaneceria ali por tempos e tempos, enquanto tudo que ela tinha era uma possibilidade boba de ser lembrada como companhia.
A vida dele não parecia ter confusão.
Ela tomou um gole de seu café, sentiu que algo além da bebida amargou em sua boca. Suas palavras.
Observou o relógio pendurado na parede, o tique-taque sincronizado com a batida seu coração.
Ele desviou os olhos das páginas do livro e a observou por um instante. Sua boca se contorceu numa tentativa de riso, frustrado pela excessiva timidez. Ela tremeu sua mão, derramando imperceptivelmente um pouquinho de seu seu café.
Ela estava ali, se confundindo por ele.
O relógio tiquetaqueava, agora no ritmo de sua dúvida. Poderia levantar e ir até a mesa dele? Não poderia levantar e ir até a mesa dele? Poderia levantar e ir até a mesa dele! Não poderia levantar e ir até a mesa dele! Poderia? Não poderia? Pode! Não pode!
Começar a se apaixonar é acidentar a si mesmo. É não conseguir atravessar a rua rápido o suficiente. É não conseguir frear o carro a tempo. O amor é uma pancada violenta, e amar é ferir-se num grau de fratura.
Talvez ela não seja capaz de despertar a curiosidade dele, não dá pra saber o que se passa na mente dele, seus olhos sempre abertos mantém sua mente sempre fechada.
O tique-taque do relógio acompanhou os passos dele em direção à saída.
As palavras que ela não disse ainda amargavam sua língua, e seus pensamentos se enchiam de suposições. "Se tivesse levantado", "se tivesse dito", "se tivesse arriscado", "se tivesse o convidado para um café", "se..."
O tique-taque já não fazia sentido.
O medo nunca fez.
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