Tetralogia Napolitana: a narrativa de Elena Ferrante de tirar o fôlego


Digo com ausência de orgulho, até com um pouco de vergonha, que demorei a me render à tetralogia napolitana, de Elena Ferrante. Quando todos falavam com fervor sobre estes quatro livros, eu vivia no mundo da lua, certamente. Começo a resenha sobre o primeiro livro, logo aqui abaixo, falando sobre minha primeira experiência com a autora, portanto, não vou me tornar repetitiva quanto à isso, mas reforço a premissa que nunca devemos julgar um autor lendo somente uma de suas obras - fica aí uma lição preciosíssima que aprendi com uma resistência incabível.

E sim, Elena Ferrante é aclamada não por ser superestimada, mas por puro merecimento. A genial aqui é ela, sem sombra de dúvidas. E todo o mistério envolto da tão aclamada escritora faz muito sentido, mas nunca saberemos se Elena Ferrante é uma mulher, uma jovem ou uma idosa, se ela na verdade é ele, ou ela e ele, ou uma empresa, ou alguém que já se foi e deixou um arsenal de livros escritos não publicados. Mas fica até mais gostoso consumir suas obras sob essas informações nunca ditas.

Preciso pontuar aqui também que a HBO tem disponível a série "My brilliant friend", inspirada na tetralogia, a qual comecei a assistir depois de ler o primeiro livro. Embora a narrativa tenha uma dinâmica totalmente diferente, a história é fiel ao livro, com poucos cortes para não ser mais parada do que já é. Talvez seja um conteúdo para fãs do livro - porque assistir a série sem ter consumido as obras, pode não abrilhantar tanto a experiência.

Fica aqui todas as minhas resenhas, também disponíveis no meu perfil do Skoob:


A amiga genial


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“ Os pequenos não sabem o significado de ontem, do anteontem, nem de amanhã, tudo é isto, agora: a rua é esta, o portão é este, as escadas são estas, esta é a mamãe, este é o papai, este é o dia, esta, a noite.”

Tardiamente pude entender em “A amiga genial” porque Elena Ferrante é tão aclamada. Meu primeiro contato com a misteriosa autora italiana foi com “Um amor incômodo”, e nesta história, não foi só o amor que incomodou. Mas no primeiro livro da série Napolitana, sua escrita, a atmosfera saudosista e a década escolhida (uma infância vivida nos anos 1950) são praticamente um abraço de tão envolvente. 

Foi neste livro também que pude notar algo que me incomoda muito: não é a primeira obra que leio em que amigas são completamente competitivas umas com as outras. Será que esse é o normal e eu que nunca tive esse temperamento com as minhas? No mais, acompanhar o crescimento de Lina aos olhos de Lenu dá saudade da época em que fazia parte da nossa vida mirim a ingenuidade, a ansiedade e a preocupação por coisas banais. Vi também nessa narrativa uma infância muito semelhante a da minha mãe - algo que aumentou ainda mais meu apreço. 

Sinopse da editora:

A reclusa autora italiana que conquistou a crítica internacional tem sua série napolitana lançada no Brasil pela Biblioteca AzulAclamada pela crítica e pelo público, Elena Ferrante se tornou conhecida por escrever sobre questões íntimas com muita clareza, sem se expor para divulgar seus livros. Sua ficção parece apresentar traços autobiográficos, mas não é possível identificar os pontos comuns entre sua vida e sua obra, uma vez que a escritora se recusa a comentar sua intimidade. 
A Série Napolitana, formada por quatro romances, conta a história de duas amigas ao longo de suas vidas. O primeiro, A amiga genial, é narrado pela personagem Elena Greco e cobre da infância aos 16 anos. As meninas se conhecem em uma vizinhança pobre de Nápoles, na década de 1950. Elena, a menina mais inteligente da turma, tem sua vida transformada quando a família do sapateiro Cerullo chega ao bairro e Raffaella, uma criança magra, mal comportada e selvagem, se torna o centro das atenções. Essa menina, tão diferente de Elena, exerce uma atração irresistível sobre ela.As duas se unem, competem, brigam, fazem planos. Em um bairro marcado pela violência, pelos gritos e agressões dos adultos e pelo o medo constante, as meninas sonham com um futuro melhor. Ir embora, conhecer o mundo, escrever livros. Os estudos parecem a melhor opção para que as duas não terminem como suas mães entristecidas pela pobreza, cansadas, cheias de filhos. No entanto, quando as duas terminam a quinta série, a família Greco decide apoiar os estudos de Elena, enquanto os Cerrulo não investem na educação de Raffaella. As duas seguem caminhos diferentes. Elena se dedica à escola e Raffaella se une ao irmão Rino para convencer seu pai a modernizar sua loja. Com a chegada da adolescência, as duas começam a chamar a atenção dos rapazes da vizinhança. Outras preocupações tornam-se parte da rotina: ser reconhecida pela beleza, conseguir um namorado, manter-se virgem até encontrar um bom candidato a marido.Mais que um romance sobre a intensidade e complexa dinâmica da amizade feminina, Ferrante aborda as mudanças na Itália no pós-guerra e as transformações pelas quais as vidas das mulheres passaram durante a segunda metade do século XX. Sua prosa clara e fluída evoca o sentimento de descoberta que povoa a infância e cria uma tensão que captura o leitor.


História do novo sobrenome



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Terminei “História de um novo sobrenome” sem fôlego, pois todo meu ar foi tomado durante toda leitura, e eu não estou exagerando. No segundo volume da série napolitana, Ferrante usou e abusou da velocidade em sua narrativa justamente para nos dar esse senso de urgência que a adolescência de Lenu e Lina exalava. 

A principio garrei um ranço tremendo por Lina jovem - a garota se tornou um alguém que não mede esforços para conseguir o que deseja, mesmo que tenha que manipular a própria amiga. Em contrapartida, a resiliência de Lenu também desalinhava por completo os meus chakras. E no meio de tantos erros de ambas as personagens, acompanhamos as duas amigas se desencontrando a todo instante, cada uma por conta de suas próprias escolhas, e por fim, esses mundos, mesmo tão distintos em decorrência da vida, acabam se colidindo novamente, e como sempre. Afinal de contas, é isso o que o verdadeiro amor fraterno proporciona. 

Eu tô completamente apaixonada por Elena Ferrante. 

“Se ela tivesse me dado seus diários na época (…) eu teria sofrido ainda mais, porque teria reconhecido naquela sua plenitude realizada o avesso do meu vazio”

Sinopse da editora: 

Envolvente e com a costumeira cadência impecável, a narrativa de História do novo sobrenome dá espaço para reflexões profundas a respeito da subjetividade, da sexualidade, do amor e, sobretudo, do papel imposto à jovem mulher em meados do século XX ― contraponto construído entre as duas personagens centrais, às voltas com as restritas possibilidades de escolha, mas ao mesmo tempo surpreendidas pelas descobertas acerca de suas próprias capacidades e seus limites. Lila, que teve os estudos interrompidos por questões familiares – muito cedo teve que trabalhar com o pai e o irmão, se casou cedo. Lenu, por sua vez, consegue se desvencilhar do destino certo das moças da época e não se casa, mas passa a se preparar para a faculdade, levando consigo as marcas definitivas da complexa relação de amizade com Lila – admiração misturada a identificação.Os personagens vão ganhando espaço na história, não apenas nos acontecimentos cotidianos relatados por Lenu, como também nos comentários subjetivos da narradora. Lenu, sem poupar de nada o leitor, escancara cenas de casamento, de adultério, de supostas e reais traições dentro de uma amizade, mas também os pequenos momentos em que parece acertar as contas com ela mesma.


História de quem foge e de quem fica




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"Aceitar que ser adulto é parar de se mostrar, é aprender a se esconder até se dissipar?"

O terceiro livro da serie napolitana de Elena Ferrante segue com o mesmo torpor das duas edições anteriores: a narrativa apressada derruba todo o peso dramático da história, como se a autora nos contasse uma fofoca. 

Aqui conhecemos muito mais de Lenu do que de Lina: o desabrochar da narradora nos transporta para a sua vida adulta - uma fase de autoconhecimento profunda, na medida em que ela alcança inúmeras e distintas conquistas profissionais e pessoais. 

E diante dessa fase mais centrada de Lenu que conhecemos um pouco mais do lado maldoso de Lina, personagem essa que eu não gostaria de ter como amiga nem que me pagassem bem por isso. Pensar em Lina me remete à um ser altamente nocivo e ruim, a qual se aproveitava, inclusive, das inseguranças e fragilidades da amiga para manipula-la a seu bel prazer. 

"Os homens são assim mesmo, pensava, pelo menos todos os que eu conheci: precisam trepar o tempo todo, se não se sentem infelizes."

Vemos aqui que Lenu, mesmo madura, ainda enfrenta sua maior inimiga: a sua insegurança, que acaba sempre sendo correlacionada a Lina. 

Prepare-se para encontrar uma Elena Greco mais politizada, se adentrando timidamente ao universo feminista, e deixando um sabor ainda mais ávido para devorar, ainda sem fôlego, cada página para finalmente chegar ao desfecho dessa história no último livro da tetralogia.

Sinopse da editora:

A continuação do aclamado A amiga genial No terceiro volume da série napolitana, Lenu e Lila partem para os embates da vida adulta. Numa sequência angustiante e sem espaço para a inocência de outrora, Elena Ferrante coloca o leitor no meio do turbilhão que se forma das amizades, das relações sociais e dos interesses individuais. História de quem foge e de quem fica é uma obra de arte a respeito do amor, da maternidade, da busca por justiça social e de como é transgressor ser mulher em um mundo comandado pelos homens.


História da menina perdida



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Eu ainda não encontrei adjetivos para definir a experiência que tive lendo essa tetralogia. Foram tantos sentimentos envoltos à este período em que devorei cada página, experimentei de muitos dissabores ao nutrir meu ranço infinito por Lina, e muitas vezes perdendo a paciência com a devoção cega de Linu, que dizer que essa história é densa chega a ser apelido. 

Aqui acompanhamos a velhice de todos os personagens dessa história, e isso para mim foi como viver muito próximo de pessoas de uma época diferente da minha, mas as quais encontrei uma característica aqui e outra ali de pessoas que conheço na vida real. Terminar o último capítulo deixou saudade de todos daquela vila simples, nada pacata, cheia de conflitos e interesses, de pessoas que podem ter existido ou não, mas que nos trazem ensinamentos silenciosos em estâncias distintas da vida.

"Somente nos romances ruins as pessoas sempre pensam a coisa certa, sempre dizem a coisa certa."

É muito entendível a lenda que diz que Elena Ferrante vive em seu anonimato justamente por escrever sobre pessoas de sua vida. A intensidade de todos os pequenos detalhes só pode ter sido inventada e não vivida se ela de fato seja a amiga genial do primeiro livro. Logo, de uma forma ou de outra, isso acaba soando meio autobiográfico. Impossível não sentir preocupação e afeto por uns, e antipatia enorme por outros, por conta dessa narrativa rica de sentimentos. Mas ao terminar essa tetralogia, me senti muito grata: obrigada Deus por eu nunca ter tido uma amizade tão horrorosa como esta. 

"Toda relação intensa entre seres humanos é cheia de armadilhas e, caso se queira que dure, é preciso aprender a desviar-se delas."

Sinopse da editora:

Autora finaliza a série napolitana que já vendeu mais de 100.000 exemplares no Brasil. A história de vida de Lenu e Lina e de todos os personagens do bairro de Nápoles agora caminham da maturidade à velhice. História da menina perdida é o final que o leitor esperava, com a dureza e a força que aprendemos a identificar nas personagens de Ferrante ― sem rodeios.


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