Diante de tantas mulheres que me trouxeram inspiração na vida, não podia deixar de mencionar, com honrarias, aquela que mais me encheu de ensinamentos na vida: a minha mãe. Mas todas as pessoas já estão até cansadas de saber que além de mãe, essa mulher, meu marco 0, também é a minha mais estimada e melhor amiga.
Antes de todas as 7, o meu marco 0 já me presenteou com a sua amizade quando eu ainda estava em seu ventre. Ela me carregou pacientemente por 9 meses. Eu já cheguei chorando e ela me amou desde então, mesmo eu tendo-a deixado em coma por algumas horas durante o parto, uma cesárea meio complicada. E mesmo colocando a sua vida em risco, ela ainda sim me amou desde o meu primeiro respiro.
O meu marco 0 sempre me tratou como a sua boneca predileta: ela me vestia de conjuntinhos fofos, penteava meu longo cabelo e produzia as mais apertadas marias chiquinhas que me deixavam parecida com uma descendente asiática (já que tudo repuxava, inclusive meus olhos). Em uma família onde os homens eram a maioria, éramos eu e ela as únicas mulheres.
O tempo foi passando, a nossa família foi se reconfigurando, meus irmãos casando, e ficou eu e ela fazendo companhia uma para outra, cada uma em seu mundinho. Meu pai era sempre ausente, eu era a adolescente que encontrava refúgio no quarto, e minha mãe era aquela mulher que mergulhava em seus projetos artesanais e assistia todos os filmes possíveis que vocês podem imaginar (aliás, puxei isso dela). Naquela época na qual eu não entendia nada, e era uma típica adolescente que só faltava comer terra, passei a enxergar a imagem de uma mulher misteriosa, silenciosa, que diante dos meus olhos parecia guardar uma bagagem de sentimentos não ditos e milhares de sonhos não vividos.
Quando perdi a virgindade, não hesitei em procurar da minha marco 0 para contar a novidade. Ela me acolheu com amor, marcou um ginecologista e me levou com carinho à minha primeira consulta. Eu não era mais tãaaao nova assim, já tinha completado a maioridade, mas tê-la comigo fez com que eu não me sentisse só - foi exatamente ali que eu soube que ela era a minha maior, melhor e mais fiel amiga.
Eu nunca escondi nada de minha marco 0. Nunca me preocupei se ela ficaria brava comigo diante de algo que eu tenha feito ou dito, muito pelo contrário - sempre soube que se era algo errado, ela iria me mostrar da maneira mais madura e clara possível, sem me magoar, sem me constranger. Ela nunca teve a necessidade de exercer algum tipo de poder sobre mim, nem quando eu merecia, nem quando por algum momento eu fui egoísta a ponto de não enxergá-la como um ser humano. Porque quando somos mais novos temos essa péssima mania de acreditar que nossos pais são imbatíveis, que eles são a fortaleza que jamais seremos. A verdade é que eles também sentem, muitas vezes mais que a gente, mas foram adestrados a não demonstrarem fraqueza para suas crias, para que assim o mundo não pareça aos nossos olhos um lugar tão difícil de sobreviver.
Só que comigo o efeito foi um pouco diferente. Demorou muito para que eu pudesse ver as fragilidades dela, mas eu sempre tive em mente que por mais que o mundo fosse um lugar meio sombrio e difícil de sobreviver, se ela estivesse ao meu lado, tudo seria possível. E assim foi: enfrentei tantas nebulosidades na vida, e com muita generosidade e carinho ela segurou a minha mão, me puxou para cima, segurou em meu rosto e disse: "tenta de novo, eu confio em você. É difícil mesmo, mas você consegue."
Meu marco 0, pra mim, sempre foi sinônimo de alegria. Ela tem a gargalhada mais contagiante de todos os tempos. Ela esbanja tanto bom humor que todas as minhas amigas sentem isso sem nem ter a conhecido pessoalmente. Quando ela está perto dos irmãos então... aí que isso se quadriplica. Eu amo ver quando eles estão reunidos, porque me mostra de onde saiu tudo isso, todo esse encantamento da minha marco 0, toda essa inspiração de união e cumplicidade. Ela não teve a melhor das infâncias, mas ela conheceu a amizade dentro da própria casa, na sua extensa família. Eles sempre foram imbatíveis juntos, cuidaram uns dos outros a vida inteira, se amam profundamente e gratuitamente, e mesmo que não demonstrem com palavras, demonstram com sinceridade em cada gesto de convivência.
Eu sinto tanto orgulho quando me dizem que eu sou a cara dela, porque ela é tão linda, tão cheia de vida, que mesmo eu travando uma batalha árdua contra a depressão desde os meus 15 anos de idade, ela é a minha principal fonte de energia e vontade de viver. Eu nunca pensei em desistir de absolutamente nada, de nenhum desafio, porque sempre lembro dela acreditando em mim. Sempre lembro dos dias em que fizemos companhia uma para a outra, as vezes até em silêncio, (durante a minha juventude até os dias de hoje), assistindo um filme, quebrando o silêncio com comentários ácidos sobre alguma cena, ou fazendo comparativos esdrúxulos de qualquer coisa. Sempre me recordo de todas as vezes que ela sacudiu a poeira e se reergueu diante de todas as coisas que a empurraram para um buraco no qual ela nunca se permitiu ficar 1 segundo sequer na vida. Sempre lembro do quanto ela é grata, do quanto as coisas mais simples são suficientes para deixá-la feliz. É nisso que me inspiro todos os dias.
Eu deixo aqui nesta foto para vocês o sorriso mais lindo, generoso e sincero que já vi na minha vida. Da mulher mais extraordinária que conheço. Da fortaleza mais inspiradora, mesmo sentindo tantas e tantas coisas, que por muito tempo para mim foram um mistério, mas que ela me confidenciou a partir do momento em que eu estava apta para entender. Essa mulher é meu marco 0, meu alicerce, minha fonte de inspiração. A melhor amiga que uma pessoa pode ter na vida. A que me ama incondicionalmente como eu a amo.
O meu marco 0 se chama Jussara. A minha mãe. A melhor.
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Este é o marco 0 da saga "as mulheres da minha vida". Os outros capítulos são:
2. Dá uma piscadinha para a câmera?
3. Eu tinha um bicho de pé que já era avô
4. Ô Tatá, olha o Chico tomando o meu leite!
5. De viadagem a gente entende
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